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Entrevista concedida a Margarida Patriota para o programa "Autores e Livros" da Rádio Senado e transmitida em 12 e 13 de maio de 2018:

Parte I

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(...)

Margarida Patriota: Olá, amigos ouvintes! Nosso entrevistado de hoje é o poeta, ensaísta e tradutor Oleg Almeida, nascido na Bielorrússia e radicado em Brasília desde 2005. Oleg Almeida é autor dos livros de poesia Memórias dum hiperbóreo (2008), Quarta-feira de Cinzas e outros poemas (2011), Antologia cosmopolita (2013) e de numerosas traduções do russo para o português. Em 2018, Oleg Almeida lança, pela editora Scortecci de São Paulo, mais um livro de poemas que traz o título de Desenhos a lápis... Oleg Almeida, perguntaria primeiro... Desenhos a lápis é um livro de poemas monotemático – não é verdade? – sobre a cidade de São Paulo?

Oleg Almeida: Sim, exatamente... Esse livro foi inspirado em minhas passagens frequentes, em minhas estadas repetidas na cidade de São Paulo, na Pauliceia. Sendo um turista, um visitante, lá indo por motivos de trabalho, para procurar meu pão de cada dia, já que as minhas traduções são publicadas principalmente em São Paulo, eu vi essa cidade um pouco do lado de fora. É que, quando você não mora em determinada cidade, você percebe... você avista outras coisas, que os habitantes desse lugar não enxergam, muitas vezes, por estarem acostumados, porque não se interessam mais por aquilo tudo, porque vivem lá, e aquilo já não tem tanta importância quanta percebe uma pessoa estranha, vinda de fora, que passa alguns dias nessa cidade, depois vai embora e fica pensando: o que foi que eu vi? como se vive nessa cidade? quais são seus problemas, quais são suas vantagens?.... E muitas outras perguntas que a gente faz a si mesmo...

 

MP: E você poderia nos explicar o título do seu livro: Desenhos a lápis? Deste livro de poemas que celebra, descreve e evoca – não é? – a cidade de São Paulo...

OA: Acontece o seguinte... Este livro é bem diferente dos meus livros anteriores: Memórias dum hiperbóreoQuarta-feira de CinzasAntologia cosmopolita. Por quê? Porque esses três livros contêm uma poesia mais sofisticada, mais prolixa, mais desenvolvida... quase barroca, eu diria. E neste livro, Desenhos a lápis, eu fixo, como meta, apanhar uma impressão instantânea, como se estivesse passeando pela cidade de São Paulo e tirasse fotos, por exemplo, ou abrisse um pequeno álbum e fizesse alguns esboços, desenhasse alguma coisa... É mais um trabalho de desenhista, mais uma tentativa de apanhar essa impressão do momento presente, algo que vem e logo desaparece, algo que você vê e que, no momento seguinte, já não existe. Por isso esses poemas são curtos, despojados, não têm tanta sofisticação: quase não uso termos difíceis, tudo é coloquial, todo o palavreado é, mais ou menos, do dia a dia, e tento mostrar, sem fazer nenhuma conclusão política ou sociocultural... quero mostrar o lado bom e o lado ruim, o que salta aos olhos, o que dá na vista durante esses passeios meio virtuais pela cidade de São Paulo.

MP: Num dos poemas de Desenhos a lápis, Oleg diz que Deus o fez poeta "por falta de simpatia"...

OA: É... É uma questão muito difícil de abordar, porque o destino de todo e qualquer poeta, eu acho, da maioria esmagadora dos poetas de vários países, de várias línguas... o destino deles é sempre difícil. É que um poeta talvez veja mais do que as outras pessoas, talvez entenda mais do que as outras pessoas, mas sempre tem dificuldade em adaptar-se, em enquadrar-se na realidade que o rodeia. Posso citar dezenas, centenas de exemplos disso, talvez...

MP: Sem dúvida...

OA: ... a começar por Baudelaire, por exemplo, na França, Púchkin na Rússia, Edgar Poe nos Estados Unidos – só os poetas de primeira ordem... Todos sofreram, de uma maneira ou de outra, e infelizmente... É claro que os cenários mudam, a vida muda, mas, infelizmente, muito disso acontece, em nossos dias, por toda a parte. Nesse ponto, para mim seria um pecado se me queixasse muito, porque, pelo menos, eu trabalho e consigo sobreviver na área literária, fazendo as minhas traduções. Mas escrever poesia ou, mais ainda, tentar, ter essa coragem de viver de poesia... é muito complicado.

MP: Muito complicado!... Estamos conversando com o poeta, ensaísta e tradutor do russo Oleg Almeida a respeito do seu último livro de poemas, intitulado Desenhos a lápis. Voltamos já.

Parte II

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Margarida Patriota: Você escreve também poesia em russo ou bielorrusso? Sua poesia teria, digamos, mais repercussão, se escrevesse?

Oleg Almeida: Acredito que não...

MP: Não?

OA: Paradoxalmente. E essa é a ironia, essa é a crueldade. Eu escrevia muita coisa em russo, quando era mais novo, principalmente: na adolescência, quando muitas pessoas escrevem versos, e depois na minha primeira juventude... Mas o que eu escrevia, aquilo ali não teve nenhuma repercussão em absoluto, ninguém estava precisando daquilo que eu escrevia, e eu também, por minha parte, cheguei a ficar amargurado com isso. Vindo aqui e radicando-me no Brasil, passei a escrever em português, porque a minha realidade fala português, e essa não é também a primeira vez que alguém escolhe outra língua para se expressar e acha que essa língua lhe proporciona mais visibilidade, proporciona, quem sabe, mais reconhecimento do que a sua língua nativa...

MP: ... que se precisa dominar bem. Você domina bem o português, não é? Eu gostaria que você desse uma ideia desse seu domínio, e da sua poesia, aos rádio-ouvintes, lendo um dos seus poemas, do livro Desenhos a lápis.

OA: Eu gostaria de ler dois poemas (um deles, um pouco maior, e o outro, um pouco menor) para dar uma ideia, talvez um pouco superficial, desse livro. Primeiro, eu mostro o lado negativo, o lado difícil, pesado, de nossa vida, da sociedade em que a gente vive, do ambiente onde a gente mora, e digo o seguinte:

 

Em nossos dias

é fácil morrer enfartado,

atropelado, eletrocutado,

abandonado pela família,

cassado pelo Estado,

drogado, desapontado.

Em nossos dias

a guerra se faz na rua,

no escritório, na feira,

cá dentro, lá fora,

real e virtualmente:

a lança disfarça-se de derrame,

a flecha de acidente,

o gládio de overdose;

o fogo flameja, o ferro brilha;

mate-se por rancor ou por brincadeira,

não acarreta vexame

a mais estúpida derrocada,

mas a vitória mais bela apavora.

Ininterrupta, infame,

a guerra é minha e tua,

quer a tenhamos por meta sagrada,

quer mantenhamos a pose

de quem nada sente.

Morra-se de velhice ou de cirrose,

aqui ou no mundo da lua,

Jerusalém está longe de ser libertada.

 

O que eu quero dizer com isso é que a violência barata, a violência que não faz sentido algum, domina a vida cotidiana das pessoas, não só aqui no Brasil – a famigerada violência daqui... – como no mundo inteiro. É o que acontece, com a degradação dos valores morais, dos valores cristãos, com essa mudança para pior que acontece no mundo inteiro. Acho que é uma tendência geral, pois o que acontece na própria Rússia, na Europa ou nos Estados Unidos não é nada melhor do que a gente tem aqui no Brasil. E o que fazer com isso? Lutar, fugir de alguma forma, desaparecer, partir para a militância política? Eu não respondo a essa pergunta: não é meu negócio. O poeta, o escritor... ele mais observa a realidade do que dá alguma receita de como mudar essa realidade. Por isso, o que escolho para mim, para minha família, é, de certa forma, uma tentativa de a gente se voltar para dentro, para dentro da nossa vida privada, de viver conforme os nossos valores, viver mantendo os nossos valores – aqueles do cristianismo, basicamente do cristianismo – e tentar preservar intacto o seu lado moral. E eu escrevo assim: não é o dinheiro, não é algum privilégio, não é alguma coisa especial que busca o autor, o "eu" lírico... Escrevo assim:

 

Não corro atrás dos encômios e regalias;

não me interessa o que se fala de mim no mercado

nem se meu nome é conhecido fora de casa.

Quero apenas ficar no meu canto seguro,

beber meu conhaque,

riscar meus rascunhos e repassá-los a limpo,

e que o sol se reflita em tuas pupilas

mesmo à meia-noite.

 

Ou seja, é uma tentativa... talvez uma tentativa trágica, talvez uma tentativa falida, mas é uma tentativa de viver honestamente, de viver de modo correto com sua família, com sua mulher amada, e preservar... Se cada pessoa pensasse, desse jeito, em preservar seus valores, em preservar sua alma...

MP: ... em não abdicar a beleza, não é?

OA: Justamente! A sociedade, a vida seriam outras.

MP: Oleg, poderia informar aos seus ouvintes o local onde o livro pode ser encontrado?

OA: Então... Meu livro Desenhos a lápis foi lançado pela editora paulistana Scortecci, e é muito fácil encontrar esse livro. É só procurar na Internet: www.scortecci... s-c-o-r-t-e-c-c-i...

 

MP: Dois "c", não é? Scortecci...

OA: Dois "c"... com.br. Eu acho que ele já está começando a aparecer também nas livrarias, mas não tenho certeza, porque o livro foi lançado recentemente. Acho, pois, que, daqui a algumas semanas ou alguns meses, também vai aparecer nas redes de livrarias.

 

MP: Muito obrigada pelas informações valiosas! Sucesso com seu trabalho...

 

OA: Eu é que agradeço... Muito obrigado!

MP: Acabamos de conversar com o poeta, ensaísta e tradutor do russo Oleg Almeida a respeito do seu último livro de poemas, intitulado Desenhos a lápis. Continuem conosco e não se esqueçam: fiquem com os livros!

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